quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Conselhos de vida II



"Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário.
Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas.
Se achar que precisa voltar, volte!
Se perceber que precisa seguir, siga!
Se estiver tudo errado, comece novamente.
... Se estiver tudo certo, continue.
Se sentir saudade, mate-a.
Se perder um amor, não se perca!
Se o achar, segure-o!"

Fernando Pessoa

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Eu... muitas




Por vezes eu... não sou eu
Vejo-me de fora,
Como se fosse outra
Assisto ao que faço,
Como se a vida não fosse minha
E não me reconheço.
Sinto tudo, mas de formas confusas e desiguais.
E não sei o que se passa
Sei apenas que sou espectadora do meu ser
Mas não sei por que me acontece.
Sinto muitos sentimentos opostos num só dia
Provocados por motivos diversos
Quantos momentos divergentes
Que vão desde a  profunda tristeza,
Vagueando pela inúmera mágoa
Chegando algumas vezes à simples alegria.
Sou tantas, sendo uma só!
Existem várias diferentes dentro de mim
E todas elas se completam
Todas elas me perfazem
E todos os sentimentos
Provocados pelo exterior
Rebentam de dentro
De forma quase ingovernável.
E, agora, como posso
Estar a ser visitada pela felicidade
De um momento há tanto desejado
Quando abrigo tanta tristeza
Que me habita com firmeza?
Olho em frente
Vimos o céu
Eu e as outras
Eu vejo-o escuro e violento
Uma outra vê-o azul e brilhante
E pergunto de novo: Quem sou eu?
Vem a resposta com o sentir
Pois ninguém é uma realidade só
E sinto o dolo e o regozijo
A dor e o contentamento
E assim vou vivendo
Muitas vezes não querendo
Ser este misto de emoções
Esta desordem de agitações
Onde o início e o fim de tudo
É apenas um: o amor!




sábado, 24 de setembro de 2011

Desisto


Não sei por que ainda insisto
Por que teimo, por que admito
Que este sentimento que me consome
Me magoa e engana
Pode um dia ser melhor
Transformar-se, ser diferente
E não me causar mais dor.

Iludo-me com algumas palavras
Com actos, sempre por fazer
Quando dentro de mim, sei não ser verdade
A Verdade que não quero ver.

Vou aceitando fragmentos
Sabendo que nunca terei o todo
Porque esse, é interdito
E se quer dar a Ninguém.

Vivo triste e com mágoa
Mesmo sem o merecer
Mas assim não tinha que ser
Pois podia ser elementar
Como as coisas superiores da vida
E, simplesmente, acontecer.

Passam os dias e os meses
E  os ventos, nas noites
Levam o que nem chegam a trazer.
O tempo não é protector
Não se compadece nem me ajuda
Nesta luta imerecida e inútil
Nesta conquista fútil
Nesta teimosia sentimental
Nesta minha insânia actual.

Vou desistir deste desatino,
Aceitar o meu destino
Olhar em frente,
Admitir este fracasso 
E eternamente soltar 
Esta quimera que me acossa.
Vou desistir...

É Proibido





"É proibido chorar sem aprender,
Levantar-se um dia sem saber o que fazer
Ter medo de suas lembranças.

É proibido não rir dos problemas
Não lutar pelo que se quer,
Abandonar tudo por medo,

Não transformar sonhos em realidade.
É proibido não demonstrar amor
Fazer com que alguém pague por tuas dúvidas e mau-humor.
É proibido deixar os amigos

Não tentar compreender o que viveram juntos
Chamá-los somente quando necessita deles.
É proibido não ser você mesmo diante das pessoas,
Fingir que elas não te importam,

Ser gentil só para que se lembrem de você,
Esquecer aqueles que gostam de você.
É proibido não fazer as coisas por si mesmo,
Não crer em Deus e fazer seu destino,

Ter medo da vida e de seus compromissos,
Não viver cada dia como se fosse um último suspiro.
É proibido sentir saudades de alguém sem se alegrar,

Esquecer seus olhos, seu sorriso, só porque seus caminhos se
desencontraram,
Esquecer seu passado e pagá-lo com seu presente.
É proibido não tentar compreender as pessoas,
Pensar que as vidas deles valem mais que a sua,

Não saber que cada um tem seu caminho e sua sorte.
É proibido não criar sua história,
Deixar de dar graças a Deus por sua vida,

Não ter um momento para quem necessita de você,
Não compreender que o que a vida te dá, também te tira.
É proibido não buscar a felicidade,

Não viver sua vida com uma atitude positiva,
Não pensar que podemos ser melhores,
Não sentir que sem você este mundo não seria igual."

Pablo Neruda

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Última viagem


Há quatro semanas que fizemos a nossa última viagem juntos mas mesmo assim ainda te espero.
Fomos todos devagar naquela grande carrinha cinzenta (como tu gostavas de carrinhas!) e em silêncio, até à tua nova casa.
Não gostei... sinceramente que não gostei. Há uns anos atrás eras tu que ias ao volante e que me pedias as coordenadas, que me pedias para te ir indicando o caminho. Desta vez, nada disseste e limitaste-te a ser conduzido, sem nada dizeres, sem te opores, sem te zangares comigo, um pouco que fosse.
Ia sentada à tua frente, tentando manter-me em silêncio, mas sabes que não consegui. Estava a ser violento demais, duro demais para eu nada dizer... para eu conseguir não chorar.
Contudo, ninguém me ouviu, ninguém me teve em conta e a viagem continuou sem que eu a quisesse fazer... sem que nós a quiséssemos fazer.
Estávamos todos tristes e revoltados, mas limitámo-nos a ser conduzidos, como se fossemos uns robots, como se não tivéssemos vontade própria.
Nessa manhã o sol brilhava, mas eu não o via. Aliás, desde esse dia que ele se tornou para mim mais sombrio e nunca mais brilhou da mesma forma.
O teu novo espaço já estava à tua espera... aberto, fundo, frio, escuro.
Era impossível fugires... era impossível eu tirar-te dali, por muito que o quisesse fazer, por muito que quisesse que eles parassem... que quisesse que tudo parasse.
E entraste nele desaparecendo para sempre, para sempre, para sempre!
Tenho ido visitar-te mas tu não me vês e nada me dizes. Permaneces escondido, calado...
Mas eu... continuo à tua espera para juntos podermos ir de novo passear... para que o sol possa de novo brilhar com a mesma intensidade... para que tudo volte a ser como era.
Disseram-me que com o passar dos dias tudo seria mais fácil, mas mentiram-me.
Tenho tantas saudades tuas... fazes-me tanta falta!!!


quarta-feira, 21 de setembro de 2011

VAI-TE





"Por que voltaste? Esquecidos
Meus sonhos, e meus amores
Frios, pálidos morreram
Em meu peito. Aquelas flores
Da grinalda da ventura
Tão de lágrimas regada,
Nesta fronte apaixonada
Cingida por tua mão,
Secaram, mortas estão.
Pobre pálida grinalda!
Faltou-lhe um orvalho eterno
De teu belo coração.
Foi de curta duração
Teu amor: não compreendeste
Quanto amor esta alma tinha...
Vai, leviana andorinha,
A outro clima, outro céu:
Meu coração? Já morreu
Para ti e teus amores,
E não pode amar-te — vai!
O hino das minhas dores
Dir-to-á a brisa, à noite,
Num terno, saudoso — ai —
Vai-te — e possa a asa do vento
Que pelas selvas murmura,
Da grinalda da ventura
Que em mim outrora cingiste,
Inda um perfume levar-te,
Morta assim: como um remorso
Do teu olvido... eu amar-te?
Não, não posso; esquece, parte;
Eu não posso amar-te... vai!"

Machado de Assis

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

SER QUE NUNCA FUI





"Começo a chorar
do que não finjo
porque me enamorei
de caminhos
por onde não fui
e regressei
sem nunca ter partido
para o norte aceso
no arremesso da esperança

Nessas noites
em que de sombra
me disfarcei
e incitei os objectos
na procura de outra cor
encorajei-me
a um luar sem pausa
e vencendo o tempo que se fez tarde
disse: o meu corpo começa aqui
e apontei para nada
porque me havia convertido ao sonho
de ser igual
aos que nunca são iguais

Faltou-me viver onde estava
mas ensinei-me
a não estar completamente onde estive
e a cidade dormindo em mim
não me vi entrar
na cidade em que em mim despertava

Houve lágrimas que não matei
porque me fiz
de gestos que não prometi
e na noite abrindo-se
como toalha generosa
servi-me do meu desassossego
e assim me acrescentei
aos que sendo toda a gente
não foram nunca como toda a gente"

Mia Couto

NÃO, NÃO É CANSAÇO…




"Não, não é cansaço...
É uma quantidade de desilusão
Que se me entranha na espécie de pensar,
É um domingo às avessas
Do sentimento,
Um feriado passado no abismo...

Não, cansaço não é...
É eu estar existindo
E também o mundo,
Com tudo aquilo que contém,
Com tudo aquilo que nele se desdobra
E afinal é a mesma coisa variada em cópias iguais.

Não. Cansaço porquê?
É uma sensação abstracta
Da vida concreta —
Qualquer coisa como um grito
Por dar,
Qualquer coisa como uma angústia
Por sofrer,
Ou por sofrer completamente,
Ou por sofrer como...
Sim, ou por sofrer como...
Isso mesmo, como...

Como quê?...
Se soubesse, não haveria em mim este falso cansaço.

(Ai, cegos que cantam na rua,
Que formidável realejo
Que é a guitarra de um, e a viola do outro, e a voz dela!)

Porque oiço, vejo.
Confesso: é cansaço!..."

Álvaro de Campos


domingo, 18 de setembro de 2011

Contentamento




Descobri agora que o contentamento
Pode ser encontrado depois
De levantadas as barreiras  que elevei.
Nos teus olhos tenho um espelho
Dos buracos que me sorvem
Porque também são os teus.
Sei que passeias
Nas suas orlas escorregadias...
Quando os dias não têm luz.
Enches-me em pleno e preenches-me
As carências, as falhas, as exigências
Que as palavras não conseguem representar
Ou o voo alto que me levas a voar.
Sou ave de arribação em liberdade
Eterna cativa do teu transmitir  
Esqueço a Terra, olvido o Mundo
Nesse único e  imenso segundo
Em que tocamos o advir.
Descanso em êxtase com o teu arrebatamento
Após os espasmos desse grande momento
Sorvo o ar, respiro o instante
Destruo o Tempo...
Nada mais pode importar!
Pretendo, então, assim permanecer
Com silêncios, com termos ou seja como for
Apenas sentir, apenas fruir, apenas experimentar
A pujança da Felicidade 
A magia do Amor!

sábado, 17 de setembro de 2011

À noite, na ilha


"Dormi contigo a noite inteira junto do mar, na ilha. 

Selvagem e doce eras entre o prazer e o sono,
entre o fogo e a água.
Talvez bem tarde nossos
sonos se uniram na altura e no fundo,
em cima como ramos que um mesmo vento move,
em baixo como raízes vermelhas que se tocam.
Talvez teu sono se separou do meu e pelo mar escuro
me procurava como antes, quando nem existias,
quando sem te enxergar naveguei a teu lado
e teus olhos buscavam o que agora - pão,
vinho, amor e cólera - te dou, cheias as mãos,
porque tu és a taça que só esperava
os dons da minha vida.
Dormi junto contigo a noite inteira,
enquanto a escura terra gira com vivos e com mortos,
de repente desperto e no meio da sombra meu braço
rodeava tua cintura.
Nem a noite nem o sonho puderam separar-nos.
Dormi contigo, amor, despertei, e tua boca
saída de teu sono me deu o sabor da terra,
de água-marinha, de algas, de tua íntima vida,
e recebi teu beijo molhado pela aurora
como se me chegasse do mar que nos rodeia."
 Pablo Neruda 

Sonho. Não Sei quem Sou




Sonho. Não sei quem sou neste momento.
Durmo sentindo-me. Na hora calma
Meu pensamento esquece o pensamento,
             Minha alma não tem alma.

Se existo é um erro eu o saber. Se acordo
Parece que erro. Sinto que não sei.
Nada quero nem tenho nem recordo.
             Não tenho ser nem lei.

Lapso da consciência entre ilusões,
Fantasmas me limitam e me contêm.
Dorme insciente de alheios corações,
             Coração de ninguém.

Fernando Pessoa

Dicotomias



Numa sociedade de valores indefinidos e de relações interpessoais cada vez mais frágeis, são ténues a maior parte das fronteiras, marcando sempre, no entanto, muitas dicotomias. Tomamos como sendo as correctas, as nossas medidas, mas... sê-lo-ão?
Onde acaba o Bem e começa o Mal?
Como determinamos o ponto em que agimos Certo e aquele em que agimos Errado?
O que baliza o limite para a Verdade e, por oposição para a Mentira?
Ou como sabemos onde acaba o Amor e começa o Ódio?
O que conhecemos acerca da Sanidade e da Loucura?  O que podemos considerar Pedir e o que passa a ser Implorar? O Sugerir e o Exigir?
Tudo se mescla, tudo se funde, Tudo passa facilmente a ser Nada... e o que, ilusoriamente parece ser Definitivo, rapidamente se torna Provisório...
Assim, a aparente Alegria, com ligeireza passa a Tristeza e, o que parece ser Ilusão, facilmente se materializa em Desilusão.
E estes antagonismos cansam-me e consomem-me, confundem-me e massacram-me. Não deveria ser assim e o equilíbrio, a estabilidade deveria ser uma constante, mas, como tudo, o Equilíbrio é cada vez  mais Instável  e a Instabilidade é cada vez mais Desequilibrada.
Estou baralhada... cansada... derrotada.
Já não quero saber de dicotomias... nem de fronteiras.... nem de relações humanas!

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Desejos




"Te desejo uma fé enorme.
Em qualquer coisa, não importa o quê.
Desejo esperanças novinhas em folha, todos os dias.
Tomara que a gente não desista de ser quem é por nada nem ninguém deste mundo.
Que a gente reconheça o poder do outro sem esquecer do nosso.
Que as mentiras alheias não confundam as nossas verdades, mesmo que as mentiras e as verdades sejam impermanentes.
Que friagem nenhuma seja capaz de encabular o nosso calor mais bonito.
Que, mesmo quando estivermos doendo, não percamos de vista nem de sonho a ideia da alegria.
Tomara que apesar dos apesares todos, a gente continue tendo valentia suficiente para não abrir mão de se sentir feliz.
As coisas vão dar certo.
Vai ter amor, vai ter fé, vai ter paz – se não tiver, a gente inventa.
Te quero ver feliz, te quero ver sem melancolia nenhuma.
Certo, muitas ilusões dançaram.
Mas eu me recuso a descrer absolutamente de tudo, eu faço força para manter algumas esperanças acesas, como velas.
Que 2011 seja doce. Repito sete vezes para dar sorte: que seja doce que seja doce que seja doce e assim por diante.
Que seja bom o que vier, pra você."

Caio Fernando Abreu 

Ternura



"Desvio dos teus ombros o lençol,
que é feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol não vem mais nada...

Olho a roupa no chão: que tempestade!
Há restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobreveio...

Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente
que da nossa ternura anda sorrindo...

Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sós!"

David Mourão-Ferreira

Do vazio em mim



É um negro infindo que me envolve
Que cresce à minha volta como uma bolha
De ar pútrido, imenso, grandioso, intenso.
Dilata e sufoca-me
O coração, que já não me sustenta.

Absorve-me, impede-me, impera em mim
Após cada perda, cada derrota, cada obstáculo.
Confunde-me com violência
E rouba-me a esperança, a fé, a última confiança.

Vagueia em simultâneo em mim
Mas envolve-me
E faz com que nada mais exista.
Isola-me do outro mundo
Projectando o pior de mim
Numa parede de trevas.

Perco o tempo
Perco os sentidos
Misturo os pensamentos.
Nada vale a pena
O futuro não existe
Tudo acaba, agora, aqui
Para sempre
Absorto neste vazio
Que me engole
Que me gela
Que me alarga
Que me anula
Que me mata!

E, na mentira, para não partir
Preencho este vazio
Com um ilusório querer
Com uma falsa ilusão
De que o tempo irá passar
De que o negro irá brilhar
E a dor, irá deixar de doer.

Há um vazio em mim...








quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Escrevo Dentro da Noite



"Estou escrevendo para não gritar. Para não acordar
os que dormem felizes lado a lado,
os que repousam, aconchegados,
os que se encontram e continuam juntos
e não precisam sonhar
porque não dizem adeus…
Estou escrevendo para não gritar. Para enfunar o coração
ao largo.
E as palavras escorrem salgadas como um córrego de águas mortas
num silencioso pranto.
Tão perto, e nem percebes minha insônia. Nem ouves a confidência.
que põe nódoas no papel para não ter que acordar-te
e se transmuda em palavras, que são estátuas de sal.
Estou escrevendo para não gritar. Para não ter tempo
de acompanhar a noite,
para não perceber que estou só, irremediavelmente só,
e que te trago comigo
sem outra alternativa que o pensamento
- cela em que me debato a olhar a lua entre grades.
Estou escrevendo para não gritar. Para não perturbar
os que se amam
se juntam, e se estreitam, e sussurram na sombra
e passeiam ao luar,
para que as palavras chovam num dilúvio, silenciosamente,
e me alaguem, e me afoguem, e me deixem pela noite a dentro
como um corpo sem vida e sem alma,
a flutuar…"


 JG de Araujo Jorge



E Depois do Adeus


      
"Quis saber quem sou
O que faço aqui
Quem me abandonou
De quem me esqueci
Perguntei por mim
Quis saber de nós
Mas o mar
Não me traz
Tua voz.
Em silêncio, amor
Em tristeza e fim
Eu te sinto, em flor
Eu te sofro, em mim
Eu te lembro, assim
Partir é morrer
Como amar
É ganhar
E perder.
Tu vieste em flor
Eu te desfolhei
Tu te deste em amor
Eu nada te dei
Em teu corpo, amor
Eu adormeci
Morri nele
E ao morrer
Renasci.
E depois do amor
E depois de nós
O dizer adeus
O ficarmos sós
Teu lugar a mais
Tua ausência em mim
Tua paz
Que perdi
Minha dor
Que aprendi.
De novo vieste em flor
Te desfolhei...
E depois do amor
E depois de nós
O adeus
O ficarmos sós."

terça-feira, 13 de setembro de 2011

À noite



Chegas no escuro como um fantasma. Mas trazes contigo o sol, o sal e o condimento que falta na  minha vida.
De narinas impregnadas em ti, entrego-me sem resistência, sem dor, sem esforço. Caem-me todas as máscaras, todas as defesas, todas as barreiras, todas as negações.
O tempo não conta. O relógio pára... não é importante, e o coração acelera.
És tu aquele, o tal, o único.
Rendo-me. Não penso em nada. Não preciso de pensar.
E, ali, prostrada de glória, recupero em minutos o que perdi durante toda uma vida de desperdício, mal vivida.
Desligo. A minha consciência desliga, ainda que seja só por um fracção de segundos.
O Nirvana é-me mostrado e, depois, vai-se.
Deixo as minhas mãos percorrerem o teu corpo suado, o teu ser másculo, descobrindo, tacteando cada pedaço, cada reentrância, cada saliência cada poro, cada sinal, cada pilosidade de ti.
De olhos semi-cerrados consigo ver tudo, sentir tudo o que se pode sentir de bom naquele momento.
Esqueço a vida, viro as costas à dor, ignoro o sofrimento que me tem acompanhado. O que é importante é o ali, o aquele tu, o nós.
Esvaeço-me nos teus braços,  suspiro de satisfação e dou-te o meu corpo despido que tem estado vazio e oco, aquele que tem sofrido as dores da alma e do coração.
Movimentamo-nos com balanços cadenciados, em sintonia, numa dança de prazer improvisada ao ritmo do momento.
Não foi por acaso que o destino nos juntou. Tudo tão semelhante, tão melodramaticamente paralelo, tão inexplicavelmente trágico que, juntos, podemos tentar procurar o advir ou saltar para o abismo (inexplicavelmente também sentimos o mesmo, manifestando-o de formas sensivelmente semelhantes).
Explodimos, ficando num só.
Ofegantes de prazer, soltamo-nos um pouco, olhamo-nos em silêncio, perscrutando o olhar do outro, esboçamos um breve sorriso quase imperceptível e trocamos um beijo ardente e carinhoso.
Surge a prosa, fácil, séria mas alegre, profunda também, triste por instantes. Falamos a mesma língua e usamos a mesma linguagem. Falas-me da mulher que eu sou e tu sentes, e enalteces-me o ego. Quero dizer-te o que penso de ti, o que és para mim mas, estupidamente, nada me sai.
E tudo se repete, de forma sincopada, uma e outra vez.
Dever ser isto a felicidade, penso para comigo, sem nada te dizer.
Depois pára. Tudo pára, mas de uma outra forma.
Abraças-me fortemente, sem medo nem estranheza, uma última vez.
Dás-me mais um beijo... trocamos umas poucas palavras. E, da mesma forma silenciosa como chegaste, assim partes. Fico só.

(...)

Viro-me na cama tentando encontrar uma posição confortável mas o meu pé esbarra no lençol enrodilhado e em desalinho, acordo e abro os olhos.
Foi apenas um sonho, quase real, tão terrivelmente real!
Afinal, as pedras da calçada continuam a chorar!!!! 

Há alturas em que, porque algumas pessoas só sabem o que é estar em silêncio, precisam de alguém  e não são capazes de o dizer.
E sem saberem, sentem-se perdidas e abandonadas que nem cachorros de rua a quem ninguém dá atenção e carinho.
E sem saberem, sentem-se pequenas e sem importância, frágeis e vulneráveis.
E ninguém dá por isso, apenas porque não há nada no seu comportamento que o denuncie, que o revele, que faça alguém suspeitar do que quer  que seja.
Mas, porque não o sabem dizer, porque não o querem dizer, continuam a fingir a sua força e a simular um bem-estar que não existe.
E o esforço é tão grande e intenso que lhes consome as últimas energias que possuímos.
E a sua já frágil qualidade de vida, degrada-se, sempre em silêncio, guardando as lágrimas na escuridão da noite ou atrás de uma porta fechada.
São tempos violentos em que a solidão pesa e dói mais do que nunca.
São tempos em questionam toda a sua vida e em que a mesma passa em perspectiva sob os seus olhos ainda abertos, sem que a consigam ver na totalidade e com realidade.
Fazem dela um balanço. Ponderam o que foi,  que podia ter sido, o que nunca chegou a ser... o que poderá ser ainda...
E põem tudo em causa, até as suas opções, mesmo as suas convicções.
Não há vidas perfeitas, certamente, mas algumas conseguem ser, de longe, bem mais imperfeitas do que outras. E, nessas alturas, as delas são sempre consideradas as mais imperfeitas de todas.
Vem a sensação de culpa, de falhanço, de auto-crítica e de auto-destruição.
Nada de positivo parece sobressair, nada de construtivo parece ter sido feito, nada de bom parece ter existido.
Apenas porque o silêncio é mais forte do que elas, apenas porque o isolamento as consome...
Agora, neste momento, há pessoas que gostavam de ser capazes de dizer uma palavra.. uma só palavra que fosse... podia ser que alguém ouvisse e o peso que sentem lhes parasse de doer!!
Há pessoas, por aí...

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

A guerra dos sexos



"Os homens são todos iguais. As mulheres são todas diferentes. Quando se perde um homem, há outro ao virar da esquina, igual.Quando se perde uma mulher, é uma vida. Os amigos arranjam-se e as mulheres também, mas as mulheres ninguém sabe como é. As mulheres sabem. Os homens pensam. As mulheres pensam que sabem. Os homens sabem que não sabem.  Mas são as mulheres que acabam por ter razão."

Miguel Esteves Cardoso

Tristeza




"A tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguém antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de doída, honrada. É uma dor que é preciso aceitar. O esquecimento não tem arte. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar."

Miguel Esteves Cardoso

domingo, 11 de setembro de 2011




"Você, que já foi tudo e mais um pouco, é agora um quase. Eu quase consigo te tratar como nada. Mas aí quase desisto de tudo, quase ignoro tudo, quase consigo, sem nenhuma ansiedade, terminar o dia tendo a certeza de que é só mais um dia com um restinho de quase e que um restinho de quase, uma hora, se Deus quiser, vira nada. Mas não vira nada nunca. Eu quase consegui te amar exactamente como você era, quase. E é justamente por eu nunca ter sido inteira pra você que meu fim de amor também não consegue ser inteiro. Eu quase não te amo mais, eu quase não te odeio, eu quase não morro com a sua presença. O problema é que todo o resto de mim que sobra, tirando o que quase sou, não sei quem é."
Tati Bernardi

sábado, 10 de setembro de 2011

Matemática, sentimentos e questões



Será que podemos aplicar fórmulas matemáticas aos sentimentos, quando os sentimos? Utiliza-se uma regra de três simples para os calcular?
Poderemos quantificar o amor que sentimos por alguém ou compará-lo com a indiferença que alguém demonstra por nós?
Será que o amor é proporcionalmente mais intenso quanto maior for a dor e o sofrimento que se tem em simultâneo?
E quanto tempo é necessário para que alguém sinta verdadeiramente saudades de outra pessoa que ama? Multiplica-se o número de dias de afastamento pela idade e somam-se as lágrimas e a desilusão?
Com que instrumento se mede a intensidade dos sentimentos?
Qual a bitola usada para mensurar a tristeza e o desalento? E a utilizada para a dor, pode ser a mesma, ou é outra?
Será que podemos falar de sentimentos inteiros, ou de conjuntos de sentimentos negativos?
Poderemos achar a raiz quadrada do amor?
Ai a matemática! Ai os sentimentos!!





"Passamos metade da vida à espera daqueles que amamos e a outra metade a deixar os que amamos."


Victor Hugo




Corpo moribundo



Apenas o coração insiste em bater
Lentamente, dentro deste corpo moribundo
Onde já não cabe mais sofrimento
Onde já não há mais espaço para a dor
Para o choro ou para a esperança.
Nada me arranca desta indiferença
E já não consigo chorar
Sentir
Pensar
Querer.
E neste corpo vazio
Ainda tão cheio de pesar
Unicamente acumulo o padecimento
De que não me consigo livrar.
Fica dor em lista de espera
Para, um dia, de novo poder sair
E mais outro ciclo começar
Em marés vermelhas de amargura.
Talvez, então, a mágoa consiga se dissipar
E para sempre me deixar
Pois a infelicidade não tem o direito
De incessantemente me alvejar
De continuamente me procurar
De constantemente me acompanhar.
Agora, se pudesse outra coisa sentir
Se conseguisse algo querer
Escolheria parar a dor
E para sempre desaparecer!

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Poema para Iludir a Vida




"Tudo na vida está em esquecer o dia que passa.
Não importa que hoje seja qualquer coisa triste,
um cedro, areias, raízes,
ou asa de anjo
caída num paul.
O navio que passou além da barra
já não lembra a barra.
Tu o olhas nas estranhas águas que ele há-de sulcar
e nas estranhas gentes que o esperam em estranhos
                                                                               [portos.
Hoje corre-te um rio dos olhos
e dos olhos arrancas limos e morcegos.
Ah, mas a tua vitória está em saber que não é hoje
                                                                                 [o fim
e que há certezas, firmes e belas,
que nem os olhos vesgos
podem negar.
Hoje é o dia de amanhã."

Fernando Namora, in "Mar de Sargaços"

segunda-feira, 5 de setembro de 2011




"O amor começa quando uma pessoa se sente só e termina quando uma pessoa deseja estar só."
Leon Tolstoi              


"Quando sofreres encara a tua dor de frente."

Alexandre Dumas

domingo, 4 de setembro de 2011

Corremos Dentro dos Corpos





"Como o sangue, corremos dentro dos corpos no momento em que abismos os puxam e devoram. Atravessamos cada ramo das árvores interiores que crescem do peito e se estendem pelos braços, pelas pernas, pelos olhares. As raízes agarram-se ao coração e nós cobrimos cada dedo fino dessas raízes que se fecham e apertam e esmagam essa pedra de fogo.
Como sangue, somos lágrimas. Como sangue, existimos dentro dos gestos. As palavras são, tantas vezes, feitas daquilo que significamos. E somos o vento, os caminhos do vento sobre os rostos. O vento dentro da escuridão como o único objecto que pode ser tocado. Debaixo da pele, envolvemos as memórias, as ideias, a esperança e o desencanto."

José Luís Peixoto, in 'Antídoto'

Metades de mim




Metade de mim é esperança, força e vontade
A outra é desilusão, fraqueza e tensão;
Metade de mim é certeza, querer e paixão
A outra é indecisão, falta de ânimo e desalento;
Metade de mim é luz, cor e calor
A outra metade é escuridão, sombra e impotência;
Metade de mim é alegria, alento e amor
A outra é tristeza, pessimismo e dor;
Metade de mim é leveza, movimento, prazer
A outra é chumbo, imobilidade e sofrimento;
Metade de mim é beleza, lascívia e  sensualidade
A outra é fealdade, vergonha e falta de luxuria...
Mas sou Mulher
Dividida e desconhecida
Perdida e esquecida do mundo
Maltratada e  incompreendida.
Estou entre duas realidades
Sempre entre vontades e intenções
Paralisada pelo dever, não cedendo ao querer
Esquecendo o que é amar
Não sabendo o que é ser amada
Apenas para poder continuar.
Metade de mim é céu...
E a outra... este inferno em que vivo!
Tantas metades de mim,
Quantas metades de mim!!

sábado, 3 de setembro de 2011





"Não caminhes à minha frente, porque não conseguiria seguir-te.
 Não caminhes atrás de mim, porque poderia perder-te.
 Não caminhes debaixo de mim, porque poderia pisar-te.
 Não caminhes em cima de mim, porque poderia cansar-me.
 Caminha ao meu lado, porque somos iguais."


Jorge Bucay




sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Os Vários Tipos de Amor




"Parece-me que podemos, com maior razão, distinguir o amor em função da estima que temos pelo que amamos, em comparação com nós mesmos. Pois quando estimamos o objecto do nosso amor menos que a nós mesmos, temos por ele apenas uma simples afeição; quando o estimamos tanto quanto a nós mesmos, a isso se chama amizade; e quando o estimamos mais, a paixão que temos pode ser denominada como devoção. Assim, podemos ter afeição por uma flor, por um pássaro, por um cavalo; porém, a menos que o nosso espírito seja muito desajustado, apenas por seres humanos podemos ter amizade. E de tal maneira eles são objecto dessa paixão que não há homem tão imperfeito que não possamos ter por ele uma amizade muito perfeita, quando pensamos que somos amados por ele e quando temos a alma verdadeiramente nobre e generosa.
Quanto à devoção, o seu principal objecto é sem dúvida a soberana divindade, da qual não poderíamos deixar de ser devotos quando a conhecemos como se deve conhecer. Mas também podemos ter devoção pelo nosso príncipe, pelo nosso país, pela nossa cidade, e mesmo por um homem particular quando o estimamos muito mais que a nós mesmos. Ora, a diferença que há entre esses três tipos de amor manifesta-se principalmente pelos seus efeitos; pois, como em todos nos consideramos juntos e unidos à coisa amada, estamos sempre dispostos a abandonar a menor parte do todo que compomos com ela, para conservar a outra.
Isto leva-nos, na simples afeição, a sempre nos preferirmos ao que amamos; e, na devoção, ao contrário, a preferirmos a coisa amada e não a nós mesmos, de tal forma que não hesitamos em morrer para a conservar. Frequentemente se viram exemplos disso, nos que se expuseram à morte certa para defender o seu príncipe ou a sua cidade, e mesmo às vezes pessoas particulares às quais se tinham devotado por inteiro. "

René Descartes, in 'As Paixões da Alma'

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

De mau, a pior...



Acreditamos que depois de alturas de sofrimento, depois de situações difíceis, depois de vivências duras e complicadas, já mais nada de mau nos pode acontecer na vida e que já nada pode piorar. 
Vã ilusão! 
É claro que a nossa vida pode sempre piorar, que o mau pode ficar péssimo e que o péssimo pode passar a ser algo para o qual ainda não consegui atribuir qualificativo. 
E isto porque, enquanto as coisas vão piorando ainda mantemos alguma esperança, ainda que ténue. Mas a esperança, também ela, vai definhando e vai sendo consumida proporcionalmente à medida do que o mau vai aumentando... e com o uso, extingue-se. 
É então que os dias perdem o brilho, a comida perde o sabor, a música perde o som, a noite fica mais negra e desaparecem definitivamente os possíveis arco-íris com os quais sonhámos.
Tem sido assim, comigo, na minha vida. 
Quando penso que já passei por todas as más experiências a que tinha direito, eis que, afinal, ainda surgem mais umas quantas... e surgem... e surgem!
Tudo me tem sido roubado, pouco a pouco, ano após ano. 
Agora tive uma perda irreparável, irrecuperável, irreconhecível. Aprenderei a lidar com ela, com esta minha nova pobreza, com este sol sem brilho, com estes dias tão frios.
Mas também há outras perdas... De quando em quando finjo acreditar em algo que entra de novo na minha vida e que aceito trazer-lhe alguma riqueza e ânimo. Qual sol de inverno, desaparece em pouco tempo, furtando-me o que a custo tinha edificado dentro de mim. E defrauda-me também uma réstia do pouco alento que me restava. Aqui também perco.
E, neste momento, despojada de tudo, despojada até de mim própria, daquela que um dia, há muito tempo, eu fui... neste momento acredito que nada de pior me pode acontecer, porque o sol já não brilha, porque já não oiço o som da música, porque já não tenho querer ou esperança, porque "tudo" me parece cheio de nada... embora saiba que, um destes dias, tudo pode ir para além do péssimo...
Um destes dias... quem sabe o que vai acontecer...