
Ela veio de novo visitar-me e provavelmente vai querer habitar-me temporariamente. Só que eu não a convidei... pelo menos voluntaria e conscientemente.
Achamos que somos uma pessoa, mas aos olhos dos outros somos alguém diferente. Desejamos ser de determinada forma, mas somos de outra apenas porque não conseguimos ser essa "tal" pessoa ou pura e simplesmente porque não nos deixam.
E é também por isso, talvez, que ela me visita.
E vem o calor excessivo, ofertando suores, seguido de um frio de rachar, que faz tremer o queixo. Uma escuridão de breu de meter medo, seguida de um sol resplandecente que fere a vista. Um peso inexplicável às costas e simultaneamente sentir asas para voar.
Mais o medo. O querer e o não conseguir. E decididamente sei que o que incomoda não é o receio do desconhecido, do que pode vir a seguir. Isso não, pois quase tudo o que era desconhecido e podia acontecer, já aconteceu.
Mas ele está comigo. Olho para trás e pouco mais consigo do que o que ficou por fazer, por alcançar, por atingir. Poderia e deveria ver o que foi feito... mas é tão pouco importante e desinteressante, que passa despercebido no meio de tudo o resto.
E são também as lágrimas salgadas, seguidas de gargalhadas estridentes, descontroladas e patéticas. A alegria e o bem-estar que são rapidamente engolidos por ela... teimosa, ganhadora, valente!
É tudo isso ao mesmo tempo colocado no misturador gigante e desmesurado em que a minha cabeça se tornou.
É o estar definitivamente deslocada em qualquer que seja o lugar, é o sentir que estou a mais ou que não pertenço a lado nenhum, que deixei de ter raízes e referências ou que, pura e simplesmente, nunca as tive.
Mesclam-se, atropelam-se as ideias e os sentires... só sei a dor. Já nem sei as palavras. Apenas os sentimentos, também eles destemperados, inqueridos.
Vou-me embora. Parto. Quero fugir de mim. Começo a fugir de mim própria. Viro-me as costas, mas persigo-me. Estranha forma esta¸ de ser, de estar, de amar. Era tão mais fácil ser outra pessoa! Como ser quem não sou?
São as lágrimas que vencem o riso. Tremo de novo.
Já não sei bem o que sou o que me tornei... no que me tornaram. Mas sei apenas e ainda o que quero, o que preciso, mas não quero admitir... digo apenas baixinho porque a fraqueza pode vencer-me também.
Fica o vazio.
Fica o que não tenho.
Fica-me a companhia da minha visita.
Por quanto tempo irá ela ficar comigo?
"Pensamento positivo. Não a deixes ficar. Não lhe dês guarida!" oiço sussurrar bem baixinho no fundo de mim...