Assisti, impotente, à tua partida lenta, ao teu afastamento. Tentei incessantemente segurar-te mas tu parecias não ter corpo e escorregaste sempre pelos meus dedos fragilizados.
Talvez o teu amor fosse pouco ou talvez não tivesse mesmo existido, pelo menos da forma que tu dizias.
Afastaste-te tanto que ficaste um simples ponto na linha do horizonte e depois desapareceste por completo.
Deixaste para trás sem as poderes apagar, as falsas palavras de enamoramento, as enganadoras declarações de sentimentos, as falazes promessas, os ilusórios desejos formulados. E isso, nunca poderás mudar, porque aconteceu. Nem isso nem o que fizeste depois, as dores que me causaste, o incómodo da espera, a ansiedade da incerteza, as insónias de delírio, a tristeza de mais uma perda, a saudade do que não se efectivou, a revolta de ter sido ludibriada, a negação do que estava a acontecer, a difícil aceitação.
Compreendi-te e aceitei-te com todas as tuas humanas imperfeições.
Ouvi-te, desejei-te e amei-te mas mesmo assim tu... tu continuaste duro, frio e impenetrável, demasiado metido na tua confusão mental para quereres sequer sair dela... demasiado ocupado em seres infeliz para poderes querer mudar e dares-me um oportunidade.
E foste esquecendo tudo o que inadvertidamente soltaste. Ou mudaste de ideias durante o trajecto? Tão inteligente e tão seguro de ti que só contaste com a tua inteligência emocional, com a tua sabedoria...
Depois... depois fiquei eu exactamente no sítio onde estava ou talvez arremessada um pouco ainda mais para trás na vida. Eu, nesse lugar mas com mais marcas, mais desconfianças, mais desencantos mas também mais certezas.
Depois... depois aceitei o caminho que me foi imposto (ou terá sido oferecido?) e onde tu não estás porque não quiseste.
Estranha e imperfeita forma esta, a tua, onde um umbigo do tamanho do mundo é o centro das tuas atenções. Estranho mundo aquele que escolheste e insististe em mover-te!
Depois... depois deixei-te partir e continuei a ser eu, com mais arestas limadas, com mais recordações gravadas.
Depois... depois compreendi que também tenho um umbigo que não quer o teu mundo porque o meu umbigo não é o meu mundo e porque o meu mundo deixa entrar pessoas e sentimentos regulares.
Depois... depois deixei de te esperar, deixei de querer querer-te, deixei de me atormentar com vãs esperanças de impossíveis e soltei-te.
Depois... depois a vida permanece quase como antes de ti e há-de continuar, não sei como, mas vai continuar até chegar a minha hora.
Depois...
JC - Inédito