As coisas vivas também se enterram. Por vezes até podem ser enterradas por seres sem vida.
Por isso, vou escavar um buraco bem fundo e vou lá enterrar todos os meus sentimentos.
Para que não surjam conflitos, escavarei outro buraco, bem fundo também, em que vou colocar as esperanças, os sonhos e os objectivos que ainda me restam.
Num terceiro buraco, cavado com rigor, reflexão e precisão, colocarei todas as lembranças de todas as vivências e de todas as pessoas que passaram pela minha vida. Sobretudo as daquelas que me foram magoando.
Finalmente, se este meu corpo ainda tiver forças, criarei um último e derradeiro buraco, mais fundo do que os outros, e nele atirarei o meu cadáver, moribundo e vazio, que pretendo abandonar e com o qual me debato dia após dia.
Terei cumprido a minha vontade e poderei, finalmente, descansar e encontrar paz.
Escolherei uma necrópole para o fazer, para ninguém mais me questionar, julgar e apontar o dedo.
Assim, liberta de tudo, talvez em espírito possa encontrar a felicidade que não encontrei em matéria.
Vou escavar quatro buracos fundos…
JC - Inédito