Tenho querido esquecer-me de ti, esquecer-me que te amei quase loucamente, que te amo ainda embora de uma forma resignada; tenho querido esquecer que, porventura tu exististe na minha vida e que, em alguma altura eu ponderei a minha existência ao teu lado, embora soubesse que isso nunca iria acontecer.
Luto comigo mesma, luto com o tempo, luto com os pensamentos, luto com os sentimentos e vou assim, dia após dia, tentando fazer o meu luto.. o teu luto.
Porém quando creio estar a arrumar-te dentro de uma das gavetas dos meus armários proibidos, eis que tu ganhas voz e me dizes algo... mas algo tão desconcertante e despropositado que também eu fico desconcertada e desconstruída, voltando assim à estaca zero, voltando ao ponto de onde tentei partir, voltando a sentir tudo de novo, tão intenso como sempre e o meu armário fica desarrumado e novamente vazio.
Não entendo o teu propósito. Não te entendo agora tal como não entendi em outras circunstâncias, embora quase perceba algumas das tuas atitudes para mim tão irracionais.
Sei que a tua racionalidade é diferente da minha; sei que nos pautamos por premissas de filosofia diversa mas, ainda assim, queria saber todos os teus porquês.
E é então que se abrem todas as chagas, todas as cicatrizes ainda por sarar, todas as feridas que tenho: as que tu me fizeste e as outras que tenho coleccionado.
Tenho vontade de te gritar, de te pedir, de te implorar até: "Ama-me para sempre ou deixa-me de uma vez por todas"... mas a voz não sai, as letras não se escrevem, as palavras morrem na ponta dos meus dedos.
E assim continuo, acompanhando o passar descompassado dos dias, vivendo aos soluços, quase secretamente esperando um milagre ou, também secretamente, desejando que eles se acabem porque nada nem ninguém me preenche ou apazigua a dor.
Mas vou morrendo aos poucos, quando a dor é tanta que não a suporto mais porque quando o sofrimento é excessivo, tenho que morrer um pouco para poder prosseguir.
Depois de ti, ficou o escuro. Não um escuro intermitente e que passa com o nascer do sol a cada novo dia, mas um escuro permanente e sombrio que ensombra este pântano por onde me movo. O pior, é que nesse escuro vejo a tua sombra apenas, sendo tu sempre algo inalcançável.
Talvez não queiras saber mas o teu afastamento arrastou consigo o resto da minha alegria, o pouco sono que ainda tinha, a última esperança que possuía e os pequenos sonhos que me restavam.
Talvez ainda hoje, mais tarde, quando as sombras já tiverem adormecido e o escuro for igual ao escuro da noite sem luar, eu consiga começar a arrumar-te numa das minhas gavetas...
maria de luz
JC - Inédito