sábado, 29 de novembro de 2008

Epitáfio


Quando partir, quando chegar a tal hora, se puder escolher, agarro no coração de todos os que amo, misturo todas as boas recordações de bons e intensos momentos, avivo-os dentro do meu próprio coração e vou para a beira-mar à espera que ela chegue.
Assim, sei que vou partir feliz e plena, quase certa de ter cumprido "A" missão que me competia.

Sei que vou aproveitar os últimos momentos em êxtase, bebendo o odor da maresia,enchendo os ouvidos com os sons do mar, das ondas que rebentam de forma incessante, com os olhos rasos dos azuis do horizonte...

Não vou ter epitáfio porque me vou imolar numa pira gigante de onde só me vão sobrar as cinzas que faço questão de serem diluídas nas águas desse mar, mas se o tivesse ele diria:
"Aqui jaze aquela que passou pela vida de forma incompleta, mas que foi feliz em alguns momentos; aquela que tentou dar parte de si no seu dia-a-dia; aquela que lançou várias sementes de amor, mas que corporizou apenas uma de forma intensa; aquela que, ao longo da vida, tentou, à sua maneira, mudar o mundo...
Aqui jaze a enigmática.."

Não seria um grande epitáfio, mas ele serviria a muitas outras marias e, mais uma vez, tal como na vida, manter-me-ia num cómodo anonimato.

Não quero partir ainda mas quero, isso sim, imortalizar a minha efemeridade partilhando com os outros, o que vejo, o que sinto e o que vivo!!!

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Morrer lentamente...


«Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música, quem destrói o seu amor próprio, quem não se deixa ajudar.

Morre lentamente quem se transforma escravo do hábito, repetindo todos os dias o mesmo trajecto, quem não muda as marcas no supermercado, não arrisca vestir uma cor nova, não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o "preto no branco" e os "pontos nos is" a um turbilhão de emoções indomáveis, justamente as que resgatam brilho nos olhos, sorrisos e soluços, coração aos tropeços, sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto atrás de um sonho, quem não se permite, uma vez na vida, fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da má sorte ou da chuva incessante, desistindo de um projecto antes de iniciá-lo, não perguntando sobre um assunto que desconhece e não respondendo quando lhe indagam o que sabe.

Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior do que o simples acto de respirar. Estejamos vivos, então!» Pablo Neruda

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Adeus, Ana... dorme em paz na eternidade



De quando em quando a vida prepara-nos dores para as quais não nos achamos preparados.

Leva-nos para longe da vista aqueles que amamos e a quem estamos ligados.


São dores inexplicáveis, atrozes, incompreensíveis, inaceitáveis. Faz-nos falta a forte presença física, o toque suave e doce, o brilho do olhar, o calor da voz...


Sabemos que eles permanecerão para sempre dentro do nosso ser, dentro do nosso coração, mas tudo isso parece insuficiente comparado com a violência da partida, com a certeza do não regresso...


Esta é a nossa vida terrena, o nosso ver, o nosso não querer.


Antes disso temos "medo" de dizer que amamos, perdemos tempo precioso com rixas e ódios de estimação, não queremos rir ou chorar com receio do que os outros possam pensar de nós.
Somos tolos!
Vamos passar a valorizar todos os pequenos momentos que passamos com os que amamos, pois eles são sempre preciosos e inigualáveis, insubstituíveis, únicos... e nunca sabemos se eles vão ou não ser os últimos, os derradeiros...

Talvez possamos viver intensamente cada momento como se fosse o último (isso sim, vale a pena) e registá-lo de tal forma que ele possa perdurar quando tudo o resto parece ter acabado.


Agora foste tu que partiste, contra a tua vontade, contra a nossa vontade, deixando no coração dos que te amam um vazio difícil de colmatar.
Deves ter sido feliz ao longo da tua pouco longa vida mas esse facto pode deixar alguma felicidade e causar algum consolo.

Vamos ficar contigo sempre, lembrar-te e guardar com carinho quem tu vais continuar a ser.


Dorme em paz, menina, dorme em paz na nossa eternidade de seres humanos e sê feliz para onde quer que vás!

O poder das palavras


As palavra são poderosas..


Elas podem acariciar-nos ou bater-nos, dar-nos poder ou fazer de nós seres impotentes.

Sofremos por elas e com elas pois elas traduzem sempre um estado de espírito, mesmo quando dizemos que não.


E todas as coisas têm um nome. Tudo se pode definir através dos nomes aos quais podemos acrescentar adjectivos, se tal for necessário.


É importante chamar as coisas, as pessoas, as situações pelos seus nomes: daí cada ser ter o seu nome próprio, cada objecto ter o seu nome comum...


Não é comum, direi eu, que haja pessoas que não querem chamar as coisas, os actos, as outras pessoas pelos seus nomes; também é substancial que os substantivos possam ter, anexados a si, adjectivos que os enobrecem, que os engrandecem ou apequenam, consoante as situações e os empregos...


Gosto de chamar concretamente os actos pelos nomes, as pessoas pelo que o são, as coisas pelo concreto, de forma simples e directa, analítica se quiserem...


Não quero ofender, magoar, minorar ou enaltecer... mas todas as coisas têm nome e, usando as palavras poderosas para os chamar... estarei a fugir das regras???


Eu tenho um nome, sou uma pessoa comum e possuo também alguns adjectivos concretos...


Mas, para quê falar de gramática quando o que é importante são as pessoas, os sentimentos e a sua dignidade??

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Presunção


Presumi tantas coisas e tantas vezes já ao longo desta minha extensa vida! Mas enganei-me em quase todas essas presunções ...

Presumi que poderia ser o mundo de alguém enquanto muitas vezes apenas ocupava uma pequena parte desimportante do seu mundo;

Presumi que a minha presença, companhia, dedicação seriam suficientes e de qualidade para que não houvesse necessidade de procurarem mais ninguém, quando na verdade em tudo fui sendo considerada paupérrima;

Presumi ser a única, a que está em primeiro lugar, a última... quando sempre fui considerada mais uma, a outra, mais outra...

Presumi, uma vez e outra que as estórias não se iriam repetir, quando elas têm tendência a passar-se repetidas vezes e a multiplicar-se de forma mórbida...

Presumi que um qualquer dia ia encontrar a felicidade, uma felicidade contínua e não apenas fragmentada em pequenas peças soltas de longos dias soltos;

Presumi sempre tanto e tantas vezes, mas o povo é sábio e ele próprio afirma através de um saber feito de experiência: "Presunção e água benta, cada um toma a que quer!"

O mais sensato será nada presumir, nada valorizar e deixar a vida correr ao sabor dos acontecimentos. Não quero água benta e não vou voltar a presunir.

domingo, 2 de novembro de 2008

Aquecimento global


Este mundo que eu vejo não é o mundo que eu penso, que eu quero, que deveria existir.

Olho primeiro para o meu umbigo lembrando-me de quando em quando, que o meu umbigo

só o é porque existem muitos outros. No entanto, em primeira instância e mesmo sem querer, o meu mundo não é "O mundo"; o meu mundo gira à volta dos que eu amo, de quem eu preciso e por quem me preocupo.

Não seremos todos egocêntricos? Ainda que pensemos no aquecimento globlal, na desflorestação da Amazónia, na crise financeira mundial, na paz entre os povos ou na fome no mundo, não pensaremos em tudo isso em função de quem somos, sentimos e ambicionamos?

Sim, tenho um grande umbigo... mas tão grande que nele cabem as injustiças sociais, a desigualdade, a luta de classes ou a preservação da natureza.

Sim, tenho um grande umbigo mas... quem não o tem???

Flash


Massaja o meu ego.

Acarinha, mesmo que timidamente, o meu ser em gestos subtis, quase impassíveis.
Dá-me o que me pertence, o que é meu por direito, o que é meu por herança, o que é meu por conquista e mérito próprio.
Valoriza-me.
Diz-me que estou viva, que sou importante, ainda que seja apenas aqui e agora e apenas para ti.
Pára o mundo, o tempo, o olhar, a respiração!
Pára tudo e contempla-me!
Pára tudo e diz que eu existo, que sou tua, que me mereço e que te mereço.
Pára tudo mas não te páres a ti próprio.
Continua.
Continua trilhando o teu caminho, caminhando o teu horizonte, planificando de forma incerta o que pretendes, hoje e sempre.
Pára mas não me esqueças nem me ignores, não me rejeites nem me odeies, não me temas nem me magoes...
Massaja o meu ego...
Trata-me com carinho, de mansinho como se fosse a tua gata, como se miasse miados inaudíveis, como se ronronasse prazeres contidos, como se me enroscasse infinitamente em ti...
Esta sou eu.
Adulta no tempo mas criança no sentir e no agir, forte por fora mas frágil por dentro, fria no parecer mas quente no querer...
Expectante vou avançando em silêncio, sem nada revelar.
Sou ser em crescimento e em mudança mas sempre e para sempre fiel a um único caminho e sempre com o mesmo objectivo: A felicidade que mora num castelo de ameias de vidro.

Crónicas


Lambendo a areia fina, as ondas vão-se e vêm-se em movimentos lânguidos e ritmados de final de tarde.

Fecho os olhos e ouço-as como se ainda as visse, como se as sentisse nos meus pés de musa desperdiçada.

O vento sopra de mansinho, timido e sereno, enquanto o mundo se movimenta, as pessoas respiram sentires e o sol acaba de brilhar.

E eu fico... queda, muda, quase impassível nesta esplanada da vida, enquanto tento esquecer o bulício de loucura do dia-a-dia.

E as vagas tímidas continuam a lamber a beira-mar... e o homem das castanhas faz o seu pregão.

Palavras




Alguém sabe?


Alguém compreende?

Alguém sabe o que é querer poder traduzir cada olhar em palavras, cada riso em frases, cada gesto em texto?

É uma necessidade imensa, infinita, infindável, inesgotável... dolorosa por vezes porque não concretizada.

Quero.

Quero traduzir aqui e agora cada batimento do meu coração, cada esgar do meu olhar, cada gesto que me é transmitido, cada rosto, cada olhar...

E vou escrever.

Vou traduzir, reduzir, resumir tudo isto a um enorme texto poético.
Vou escrever, sempre à mesma cadência com que respiro, ao mesmo ritmo de cada batida do meu coração, compassadamente e sem arritmias.
Vou escrever... sempre... mesmo quando mo impedirem de o fazer!!!

Libertação


Vou libertar-me!!

Vou deixar-me invadir, docemente, pelo castiço e soltar toda a doidice que existe dentro do meu Ser.

Vou abrir as portas à loucura, libertar o amor, soltar as contenções de anos que me tolhem, amarram, agrilhoam...

Quero poder ser eu! Eu! Eu em todas as dimensões, com todas as loucuras, manifestando-me sem ser julgada, sem ser apontada, marcada...

Libertar as palavras, os risos, as gargalhadas, os actos...

Deixar os cabelos desgrenharem-se ao vento, rebolar na areia molhada, rolar encosta abaixo até à baía...

Uma baía de mil recortes, de mil odores, de mil sabores, de mil cores.

Inventar um novo tempo e um novo lugar e, a cada sopro, respirar liberdade e amor!

Ai sim, sim! Vou libertar-me!